Por Roniwalter Jatobá.
Rudyard Kipling. |
– O brasileiro diz que o seu país é cheio de corrupção!
Quem
fez essa afirmação, tão atualíssima em relação ao nosso país, foi o escritor
Rudyard Kipling, Prêmio Nobel de Literatura de 1907, no começo do século 20,
depois de alguns dias em visita ao Brasil.
Vamos
à história. Kipling chegou ao Rio de Janeiro, então capital da República, no
final da tarde de 13 de fevereiro de 1927. Foi recebido com festa. Numa
recepção na Academia Brasileira de Letras, estavam presentes dezessete
acadêmicos, de Afonso Celso a Coelho Neto, além dos embaixadores da Inglaterra,
França, Estados Unidos, Argentina, diplomatas, e Getúlio Vargas, na época
ministro da Fazenda.
Na
segunda semana de março, Kipling desembarcou do navio Sierra Cordoba, no porto
de Santos, em companhia do advogado Alexander Mackenzie, vice-presidente da
Light. O romancista e poeta era uma celebridade literária mundial e “cantava as
glórias perenes” da Inglaterra, ainda a maior potência colonial do mundo. Em
prosa e verso, exaltava a coragem com que os ingleses enveredavam por terras
estranhas no continente asiático e, com “sacrifícios”, levavam a este mundo o
estilo de vida britânico.
O
canadense Alexander Mackenzie, também súdito de sua majestade (na época o rei
Jorge V), acompanhou Kipling do Rio a São Paulo para mostrar, em Cubatão, o
trabalho da Light na Serra do Mar – as represas e uma usina elétrica. Tudo por
interesse. Afinal, uma impressão favorável no Morning Post, de Londres, onde o escritor publicava seus relatos de
viagem, seria um excelente negócio para a empresa canadense, já que seu capital
era também inglês e suas ações, negociadas na Bolsa de Londres.
Relatou
o escritor, nascido em Bombaim, Índia, sobre a terra de contrastes: “Chegamos a
Santos, porto de São Paulo, sob a claridade bronzeada de um céu da África
Ocidental, subimos um tortuoso rio holandês. Montões de bananas desciam o rio
em barcaças e se juntavam às cargas verdes de vapores cremes com chaminés
pretas e vermelhas. A atmosfera é a do Sul da Índia. Saímos da cidade por uma
estrada vermelha. O carro entrou por uma via lateral que lembrava o sopé do
Himalaia, embora o clima fosse tão quente como o de Madrasta.”
Na
verdade, Kipling veio, viu e não gostou do complexo hidrelétrico construído pela
Light.
– Ridiculamente fácil – escreveu em seu jornal.
Mas
ficou deslumbrado com a Serra do Mar e “as generosas tempestades tropicais”.
Em
São Paulo, o escritor ficou hospedado no hotel Esplanada, um dos mais chiques
do centro da cidade. Foi a uma recepção no São Paulo Athletic Club e visitou
“na extremidade de um dos intermináveis subúrbios de São Paulo, uma fazenda de
criação de cobras onde se preparam e distribuem soros contra as dentadas de
cobras venenosas, que são abundantes por aqui”. Era o Instituto Butantã.
Antes
de seguir para o Uruguai e Argentina, Kipling, que mostrava muito interesse
pelo que hoje se chama de ecologia, ficou fascinado com dois exemplares da
nossa fauna: a onça e o tatu. Contam que ganhou e levou para a Inglaterra um
tatu-bola, que em sua terra exibia para os amigos.
O escritor inglês, nascido em 1865, faleceu
em 1936. O saudoso jornalista e cronista Otto Lara Resende escreveu certa vez
na Folha de S. Paulo que fez muita
pesquisa e não descobriu o que aconteceu, em terras inglesas, com o tatu-bola,
agora em risco de extinção.
Sabemos, no entanto, que hoje,
infelizmente, o Brasil ainda ocupa uma bela posição na lista suja da corrupção
global. Os brasileiros, ouvidos pelo observador inglês há quase um século,
tinham razão.
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