Por Roniwalter Jatobá.
Durante muito tempo, guardei as mais
estranhas coisas. Aos seis anos de idade, não me apartava de um monte variado
de bolinhas de gude. Depois, chegou a época das borboletas. Já um pouco mais
crescido, baixou em mim o espírito de um pesquisador científico e passei
noturnamente a recolher besouros. Só para se ter uma ideia, reuni, numa cômoda
de casa, cerca de 40 espécimes, desde o cascudo, que parecia uma joaninha, até
o raro besouro-saltador.
Comento isso ao encontrar um amigo
num sábado na feira de antiguidades da praça Benedito Calixto, em Pinheiros,
São Paulo. O amigo estava ali por um motivo muito pessoal. Morador no interior
paulista, lá para as bandas da Alta Sorocabana, ele é colecionador de
cartões-postais e possui mais de 80.000 exemplares do mundo inteiro em seu
acervo.
Ele me conta que à primeira vista
eles são simples retângulos de papel, mas possuem mais de um século de
história. A invenção nasceu na Áustria em 1869, idealizada pelo professor
Emmanuel Hermann. No Brasil, passou a ser usado pelos Correios a partir de
1880. Os primeiros não continham fotos nem desenhos. Eram simples cartolinas
pré-seladas e que não necessitavam de envelopes.
A época de ouro do cartão-postal foi
de 1900 a 1930, embora seja ainda muito usado hoje. Antigo ou moderno, sempre constituiu
valioso recurso para os pesquisadores de história e de geografia,
importantíssimo para saber o modo de vida, usos e costumes de povos e países.
– Uma coleção de postais é uma
verdadeira janela para o mundo – acredita o amigo. – Além disso, é uma
excelente terapia para o atribulado ser humano da atualidade, ajudando-o a
combater o estresse da vida moderna. Uma espécie de fuga, uma viagem sem
passaporte, sem pesadas malas, sem a confusão de rodoviárias e aeroportos.
Há, inclusive, um estudo do escritor
pernambucano Gilberto Freyre sobre o cartão-postal no começo do século. Ao
visitar a Feira da Ladra, em Lisboa, encontrou vários postais à venda numa
barraca de antiguidades, cujo tema era a Amazônia na época áurea da borracha. A
atenção dele foi despertada pelas paisagens do seu país, mas, principalmente,
pelo conteúdo. As mensagens escritas no verso pelos emigrantes portugueses que
vieram para a região descreviam as aventuras: o novo lar, as árvores
gigantescas, os bichos, o movimento dos portos, as belezas dos teatros de Belém
e Manaus. Num deles, o remetente exaltava até mesmo a maravilha do banho diário
e o uso do chuveiro.
Reafirmo ao amigo interiorano, que,
como a maioria das crianças, tive muitas manias. Quando menino, guardei
bolinhas de gude, borboletas e besouros. Mas, na verdade, eu era muito mais um
colecionador de sonhos.

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