![]() |
Cachorro! |
Por Rômulo Reis Cesco.
Um pouco cansado do mundo e da rotina do dia a dia, Joel entra no seu carro e
pisa fundo no acelerador, querendo logo chegar em sua casa, para ouvir suas
músicas, para fazer carinhos em seus cachorros, pra sentir aquela solidão
deliciosa pela qual ele tanto lutou. Antes de chegar em casa, tem de passar na
padaria pra comprar pão, queijo, salame e maionese - ele tem o hábito de conversar
com os atendentes, saber como foi o dia deles, interagir, entendê-los, se fazer
presente no dia deles, deixar um pedaço seu ali.
Compra também biscoitos crocantes para seus cachorros, gosta muito deles, são
como se fossem seus filhos, seus únicos filhos, seus familiares, seus amigos.
Joel vive na dualidade de estar sozinho e se sentir só. Joel trabalha numa
daquelas empresas que te deixam extenuado fisicamente mas deixam o intelecto
intacto - como que dizendo que o homem forte não tem nada mais à oferecer do
que seus músculos, e que seu cérebro não faz nada de bom além de mandar os
comandos que movem as pernas, braços e mãos.
Ele não tem muito estudo, nem tanta posse assim, tem um fusca meia sete e uma
moto de duzentos e cinquenta cilindradas - que usa pra longas viagens. Sua casa
é alugada. Seus cachorros são comprados. Sua vida é dada. Nada é dele. O carro
vai enferrujar, com a moto ele vai cair e se ralar. Os cachorros morrerão.
E ele, o que deixou ? Deixou uma vida inteira de tevê ligada depois do
trabalho, passando a roupa do dia seguinte, lavando a roupa suja do dia de
hoje, ligando pra mãe e pro pai, querendo saber da irmã que está no centro de
reabilitação. E o que sobra pra ele ? A raspa do pão, o bagaço da laranja, a
seringueira sem seiva. E o amor Joel? Aonde está o teu amor ? - Pensa ele
consigo. Não sabe se responde ou se cala aquela voz que lhe pergunta, sendo que
a resposta pra essa pergunta ele não tem. Minto. Tem, ali dentro ele sabe que
tem. O amor.
- Aquele sentimento que sempre vem acompanhado de dor ? - Não Joel, aquele que
te ensina que pra ter felicidade, qualquer dor é insignificante.
"Mas esse não conheço, não sei de onde vem e nem sei se existe."
Joel olha pra seus cachorros e sente que a fidelidade deles é amor. Amor no seu mais
puro exemplo. Amor na sua mais pura forma. E ele ri pensando em todas as
mulheres que o chamaram de cachorro... "Ah, se elas entendessem";
afasta de si esse questionamento que só o faz perder tempo, tem que fazer
comida e ver a novela das oito, depois vai dormir, pois amanhã a rotina chama e
precisam de seus músculos, e não de seus questionamentos.
Rômulo Reis Cesco é granduando de Direito pela Universidade São Judas Tadeu. Seus textos de natureza crítica assumem, porém, aspecto poético, e posicionam a condição da humanidade em geral e do jovem em particular sob a luz da reflexão filosófica. Seus textos são um convite ao compartilhamento e à solidariedade.
0 comentários:
Postar um comentário