Alice no País das Maravilhas tornou-se, desde o seu lançamento, em 1865, um grande clássico da literatura infantil. Seu autor, o inglês Charles Lutwidge Dodgson, usou o pseudônimo literário Lewis Carroll. Sua obra principal, sucesso imediato e retumbante, chegou às mãos da rainha Vitória, da Inglaterra, que fez questão de conhecer as demais obras do autor. Antes de Alice, Dodgson escrevera apenas tratados de Matemática. A história, ao longo de mais de um século, foi adaptada várias vezes para o cinema. Virou filme de animação dos Estúdios Disney em 1951. O cineasta Tim Burton dirigiu uma versão excêntrica, que estreou em 2010. A primeira adaptação, no entanto, foi um filme mudo rodado no Reino Unido em 1903.
João Gomes de Sá, um dos mais respeitados cordelistas da atualidade, é o autor da versão em cordel de Alice no País das Maravilhas. O poeta, atento às soluções criativas do texto original, reconstruiu algumas situações, emprestando características nordestinas à protagonista, aos personagens e cenários. O início já dá uma amostra do que vem a seguir: Alice, em perseguição ao Coelho Branco, não cai num poço, mas numa cacimba encantada. O Gato de Cheshire ou Gato Risonho, mesmo conservando o dom da invisibilidade, é um típico repentista nordestino. Para compor o personagem, João se inspirou no cantador paraibano Sebastião Marinho. Alice ainda encontra, na estranha terra, maravilhas que remetem ao clássico cordel Viagem a São Saruê, do poeta paraibano Manoel Camilo dos Santos (1905-1987). A estrofe, reproduzida abaixo, mostra essa fusão:
Por lá viu rios de leite,
Montanhas de goiabada,
Castelos de rapadura,
E árvores de marmelada.
Suspirou muito porque
Somente em São Saruê
Tal riqueza era encontrada.
O Chapeleiro Louco, personagem de grande importância no original de Carroll, tem, aqui, “O mesmo céu estrelado/ Do chapéu de Lampião”. Na versão do nosso cordelista, os tacos-flamingos e as bolas-ouriços do jogo disputado entre Alice e a Rainha de Copas se transmutam em seriemas e tatus-bolas, animais da fauna brasileira.
Marco Haurélio
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