segunda-feira, 21 de julho de 2014

BRINCANDO COM A LÍNGUA - O GPS do complemento nominal

Por Therezinha Hernandes.
  
Diferenciar o complemento nominal do adjunto adnominal tem sido a via crucis de muitos estudantes; porém, existem maneiras de identificá-los com segurança, e é disso que trataremos hoje.

A análise sintática, que antigamente era chamada de análise lógica, gira em torno de dois eixos principais, que são o verbo e o substantivo.

O substantivo é o eixo ao redor do qual gravitam outras palavras, que funcionam como seus determinantes. São os artigos (que determinam gênero e número), os numerais (que quantificam o substantivo), os pronomes (que ora substituem o substantivo, ora o acompanham, modificando-o de alguma maneira), os adjetivos e locuções adjetivas (que atribuem qualidades ao substantivo).

Tomando como base o substantivo livros, podemos encontrar as seguintes estruturas:

  • os livros – os, artigo definido masculino plural (determinando gênero e número do substantivo livros)
  • cinco livros – cinco, numeral cardinal (quantificando o substantivo livros)
  • meus livros – meus, pronome possessivo (modificando o substantivo livros – já não são quaisquer livros; são os livros que pertencem a mim)
  • livros antigosantigos, adjetivo (qualificando o substantivo livros)
  • livros de gramáticade gramática, locução adjetiva (igualmente qualificando o substantivo livros)
  
Esses determinantes sempre vão se referir apenas a substantivos; se acompanharem uma palavra de outra classe gramatical, esta será substantivada (a chamada derivação imprópria):

O dia já vai amanhecer – nesta oração, amanhecer é verbo.

O amanhecer é sempre um espetáculo grandioso – nesta oração, contudo, a presença do artigo o transforma a palavra amanhecer num substantivo.

Quando lidamos com artigos, numerais, pronomes e adjetivos, não é difícil constatar sua função como adjuntos adnominais. O problema começa com as locuções adjetivas, muitas vezes difíceis de distinguir do complemento nominal, visto que tanto as locuções adjetivas (que funcionam como adjuntos adnominais) como os complementos nominais se iniciam por preposição.

Primeiramente, cumpre esclarecer que há três classes gramaticais que são designadas genericamente como NOMES: o substantivo, o adjetivo e o advérbio.

Existem nomes (substantivos, adjetivos, advérbios) que demandam uma complementação de seu sentido, assim como os verbos transitivos, que necessitam de complementos também.

Os complementos de verbos transitivos são o objeto direito e o objeto indireto; os nomes “transitivos” (cujo significado se revela incompleto) recebem um complemento nominal.

Acabamos de ver que artigos, numerais, pronomes, adjetivos e locuções adjetivas referem-se apenas a substantivos. Assim, quando a palavra em análise for um adjetivo ou um advérbio, a expressão que a eles se refere só poderá ser um complemento nominal. Assim:

Sua decisão foi contrária aos nossos interesses. Aqui, a expressão “aos nossos interesses” refere-se ao adjetivo contrária; portanto, aos nossos interesses é complemento nominal do adjetivo contrária.

Independentemente de sua opinião, vamos adotar este cachorro. Neste exemplo, “de sua opinião” refere-se ao advérbio independentemente, e assim de sua opinião é complemento nominal do advérbio independentemente.

Quando lidamos com substantivos é que a coisa muda de figura. Então, vamos facilitar o caminho:

Apenas substantivos abstratos podem requerer complemento nominal; os concretos terão adjunto adnominal. Substantivos abstratos são aqueles que não possuem existência independente (isto é, dependem de outro ser para existir, como no caso de substantivos que designam sentimentos, emoções, ações, etc.; normalmente são derivados de verbos e de adjetivos). Exemplificando:

a) concretos: mesa de madeira (mesa, substantivo concreto; de madeira, locução adjetiva = adjunto adnominal de mesa); bolsa de couro (bolsa, substantivo concreto; de couro, locução adjetiva = adjunto adnominal de bolsa);

b) abstratos: medo de avião (medo, substantivo abstrato; de avião, complemento nominal de medo); aptidão para o trabalho (aptidão, substantivo abstrato; para o trabalho, complemento nominal de aptidão); lembrança do passado (lembrança, substantivo abstrato; do passado, complemento nominal de lembrança).

Como dissemos há pouco, substantivos abstratos podem derivar de verbos e de adjetivos. Assim, substantivos abstratos, derivados de verbos e de adjetivos, requerem complemento nominal:
  
verbo (transitivo)
complemento verbal (“objeto”)
substantivo abstrato
complemento nominal
desejar
inventar
obedecer
depender
desprezar
colocar
recear
convidar
a vitória
um aparelho
às leis
dos pais
a morte
cartazes
mudanças
para uma festa
desejo
invenção
obediência
dependência
desprezo
colocação
receio
convite (o ato de convidar, não o objeto)
de vitória
de um aparelho
às leis
dos pais
da morte
de cartazes
de mudanças
para uma festa
  
adjetivo “transitivo”
complemento nominal
substantivo abstrato
complemento nominal
apto
desejoso
louco
ávido
certo
para o trabalho
de vencer
por chocolate
pelo sucesso
da derrota
aptidão
desejo
loucura
avidez
certeza
para o trabalho
de vencer
por chocolate
pelo sucesso
da derrota

Espero que isso tenha descomplicado um pouco a distinção entre complemento nominal e adjunto adnominal.

E, como falamos de locuções adjetivas, alguém já desvendou o enigma do “leite de cabra em pó”? Em breve mostraremos a solução!

Até nosso próximo encontro.

0 comentários:

Postar um comentário