domingo, 18 de maio de 2014

BRINCANDO COM A LÍNGUA: NÃO MALTRATE O PORTUGUÊS - Sobre simplificações

Por Therezinha Hernandes.

Nas últimas semanas, temos acompanhado a polêmica em torno de um projeto de simplificação da linguagem em obras clássicas da literatura brasileira. Essa ideia não é nova – já se publicaram edições “facilitadas” antes; a novidade é que, agora, são visados autores nacionais. Resumindo a ópera, é quase um caso de tradução do português para o português.

À parte as discussões acaloradas, do ponto de vista literário e educacional, sobre a pertinência ou não dessa “facilitação”, o assunto traz à baila várias questões de natureza gramatical, como o uso de sinônimos e a ordem dos componentes de uma frase.

Porém, nem sempre a simplificação é algo ruim. Cumpre acima de tudo destacar um princípio elementar da nossa língua: o princípio da economia, segundo o qual o que pode ser dito em uma palavra não deverá ser dito em duas; o que pode ser dito em duas não deve ser dito em três, e assim por diante.

Não vamos aqui tratar de estilo literário – nosso assunto é a gramática. Assim, vamos começar a aplicar o princípio da economia às normas gramaticais, começando pela acentuação.

Relembrando: de acordo com a posição da sílaba tônica (aquela que se pronuncia com maior intensidade), as palavras se dividem em oxítonas, paroxítonas e proparoxítonas, conforme a sílaba tônica seja a última, a penúltima ou a antepenúltima, respectivamente.

A regra mais simples é a das proparoxítonas, haja vista que todas são acentuadas: médico, antropólogo, esquizofrênico, último, hálito, etc.

Como nem todas as sílabas tônicas são necessariamente acentuadas na escrita, existem processos mnemônicos (de memorização) para auxiliar estudantes a guardar, por exemplo, quais paroxítonas devem ser acentuadas, como “lirnuxão” e “rinilux”, mas não abarcam todos os casos, e algumas terminações acabam ficando de fora.

Ao invés de memorizarmos todos os casos em que paroxítonas são acentuadas, utilizemos um processo mais rápido: a exclusão. Observemos o quadro abaixo:
  

TERMINAÇÕES

OXÍTONAS
E
MONOSSÍLABAS TÔNICAS
Recebem acento


PAROXÍTONAS



Não recebem acento
sofá/sofás
café/cafés
cipó/cipós
você/vocês
avô/avós
dá-lhe
dê-me
vendê-lo
negá-lo
repô-las

armazém, vintém, ninguém, alguém, contém (singular), contêm (plural),
[eles] têm (plural)
parabéns

A, E, O – seguidos ou não de S
EM,
ENS

acaba, morena
sabe, greve
cavalo, banco
jovem, item
jovens, itens
  
Como se pode ver, observando as mesmas terminações, se as palavras forem oxítonas ou monossílabas tônicas, recebem acento gráfico; se forem paroxítonas, não são acentuadas.

Não sendo, porém, paroxítonas terminadas em –a, -e e –o (seguidos ou não se –s), -em ou -ens, as demais serão acentuadas: táxi, júri, lápis, tênis (paroxítonas terminadas em –i ou –is); bônus, Vênus (paroxítonas terminadas em –us); ímã, ímãs (paroxítonas em –ã ou –ãs); órfão/órfãos, órgão/órgãos, bênção/bênçãos (paroxítonas em –ão/-ãos); revólver, caráter (paroxítonas em –r); nível, afável, fácil (paroxítonas em –l); tórax, bórax (paroxítonas em –x); cárie, série, intempérie, barbárie, Bavária, história, memória, murmúrio, níveis, afáveis, fáceis (paroxítonas terminadas em ditongo, seguido ou não de -s); pólen, hífen (paroxítonas terminadas em –n; note-se, aqui, que o plural não leva acento, pois resulta em paroxítonas terminadas em –ens: polens, hifens).

Bem mais simples.

O que aconteceu com o acento dos ditongos abertos –éu, -éi e –ói a partir da última reforma ortográfica já é outra história, que fica para o nosso próximo encontro.

Therezinha Hernandes é advogada tributarista e especialista em Direitos da Personalidade. Formada também em Letras, pela USP, é professora de Língua Portuguesa para ensino médio e para cursos pré-vestibulares. Gosta de música - da folclórica à ópera, mas cantou em bandas de rock’n roll com muito feeling. Ministra oficina de leitura e interpretação de textos para professores da rede pública.

4 comentários:

  1. Gostei muito da explicacao de acentuacao e fiquei pensando sobre a simplificacao da linguagem....esperamos voce nos explique mais.

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    1. Que bom, Maggie!!!
      Fico muito feliz por você acompanhar a coluna.

      Beijão e uma ótima semana!!

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  2. TT, gostei bem da sua crônica. Croniquemos! Já imprimi a tabelinha aqui - espero pela próxima semana. Nós que somos da literatura precisamos, e muito, de um reforço de gramática!
    Obrigada!
    Susana

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  3. Eu penso o seguinte: se tem dúvidas, pesquise, pessoas cultas não discute maneiras de falar, nós vivemos num país com dimensões continentais, falar diferente só mostra a sua cultura, eu amo essa nossa língua, ao contrário do Caetano que diz: roçar a língua de Camões, eu gosto mesmo é de sentir minha língua roçar todas essas línguas.

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