Por Eder Lima.
O
Sarau da Casa Amarela é um evento cultural de grande importância em
valor estético e artístico para a região de São Miguel Paulista, e o 28º Sarau
não deixou a menor dúvida quanto a isso. Os que estiveram presentes puderam
presenciar a grande diversidade poética, musical, rítmica, estilística,
estética, fraterna e humana que a arte e apenas ela “pode proporcionar num
mundo fascista”, como diria o genial Carlos Moreira em seu
poema-manisfesto. A diversidade a que
me refiro pode ser fruída, ou como diria Escobar Franelas, degustada, pelos
presentes na tarde de sábado (11/10/2014) na edição que teve como convidado
especial o grande músico, baixista, compositor e contador de causos Zé Afonso o
lendário Osnofa, ex integrante do Grupo Matéria Prima (o qual tive o grande
prazer de ter trabalhado no início da
minha trajetória musical), parceiro de Edvaldo Santana, Tom Zé, dentre outros.
Do
alto dos seus sessenta e poucos anos ele ainda se diz menino e destila veneno
de sua boca ferina e sarcástica. Os que não o conheciam se surpreenderam com as
letras sagazes, por vezes irônicas, cobertas por músicas compostas por melodias
carregadas de lirismo e harmonias conectadas a mais fina tradição do choro,
choro canção, samba de breque e com pitadas de blues e rock and roll. Nós, que
já o conhecíamos também nos surpreendemos e nos emocionamos ao percebermos um
brilho extremo em seus olhos e uma emoção quase controlada em sua voz, ainda
muito potente e singular.
Os
primeiros acordes trouxeram a música Cachimbo, de sua autoria em parceria com
Edvaldo Santana, acompanhado por este que voz escreve na flauta transversal. Na
sequência, um desfile de grandes obras e uma diversidade de gêneros poéticos e
musicais que deixou a todos atônitos em alguns momentos. Ao lirismo de
“Crepúsculo”, música composta sobre poema de Olavo Bilac seguiu-se “Desse
Fruto”, música de Osnofa e Edvaldo Santana sobre poema de Akira Yamazaki que narra as diferenças e as distâncias sociais
que ainda persistem nas periferias de São Miguel e do mundo. Em seguida,
fazendo um contraponto, Osnofa batuca em seu violão o samba Zé Neguinho
trazendo ao conhecimento do publico os personagens e anti-heróis mais ilustres
dos botecos e das madrugadas de São
Miguel.
Como
se não bastasse, ele traz em sequência três canções de seu CD solo, “Pra Mim”
(H-melanciou, Boleramba de Breque e Pré-doencia) que narram momentos de sua
vida pessoal, rememorando os tempos em que trabalhava como técnico eletrônico e
as consequências familiares quando decide tronar-se músico e se casar. Não me
atentarei aqui em fazer uma análise mais profunda do ponto de vista formal e
estético dessas composições mas acredito que voltarei a esse tema com mais
subsídios em outro momento.
A arte de
Zé Afonso Osnofa e o acontecimento, a verdade que ela nos trouxe nesta edição
do sarau da casa amarela, aponta para um caminho, não trilhado pela grande
indústria musical, mas que presumo ser vital que percorramos no contra fluxo
das imposições culturais pasteurizadas a que somos submetidos diariamente. É
chegada a hora de refletirmos um pouco mais sobre a arte e qual sua força
diante deste mundo que nos é oferecido.
Zé Afonso Osnofa pode ser resumido nas palavras cortantes do
poeta Carlos Moreira como:
o artista sem momento.
o artista sem patrão e sem limites.
o artista simplesmente
como o sujeito que entra de repente e ilumina a cena e revela a máquina
o artista simplesmente
como o sujeito que entra de repente e ilumina a cena e revela a máquina
monstruosa triturando tudo.
porque sim. por que não?
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Eder Lima: Músico (compositor, violonista e saxofonista)
e Artista Plástico. Arte educador formado em Arte pela Unimesp e Pós-graduado
em Estética e filosofia da Arte pela UNESP. Atualmente colabora com A Casa
Amarela Espaço Cultural de São Miguel Paulista.
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