quarta-feira, 15 de outubro de 2014

SP: Zona Leste - Zé Afonso Osnofa: Lirismo e Potência na Casa amarela

Por Eder Lima.

O  Sarau da Casa Amarela é um evento cultural de grande importância em valor estético e artístico para a região de São Miguel Paulista, e o 28º Sarau não deixou a menor dúvida quanto a isso. Os que estiveram presentes puderam presenciar a grande diversidade poética, musical, rítmica, estilística, estética, fraterna e humana que a arte e apenas ela “pode proporcionar num mundo fascista”, como diria o genial Carlos Moreira em seu poema-manisfesto.    A diversidade a que me refiro pode ser fruída, ou como diria Escobar Franelas, degustada, pelos presentes na tarde de sábado (11/10/2014) na edição que teve como convidado especial o grande músico, baixista, compositor e contador de causos Zé Afonso o lendário Osnofa, ex integrante do Grupo Matéria Prima (o qual tive o grande prazer de ter  trabalhado no início da minha trajetória musical), parceiro de Edvaldo Santana, Tom Zé, dentre outros.

Do alto dos seus sessenta e poucos anos ele ainda se diz menino e destila veneno de sua boca ferina e sarcástica. Os que não o conheciam se surpreenderam com as letras sagazes, por vezes irônicas, cobertas por músicas compostas por melodias carregadas de lirismo e harmonias conectadas a mais fina tradição do choro, choro canção, samba de breque e com pitadas de blues e rock and roll. Nós, que já o conhecíamos também nos surpreendemos e nos emocionamos ao percebermos um brilho extremo em seus olhos e uma emoção quase controlada em sua voz, ainda muito potente e singular.

Os primeiros acordes trouxeram a música Cachimbo, de sua autoria em parceria com Edvaldo Santana, acompanhado por este que voz escreve na flauta transversal. Na sequência, um desfile de grandes obras e uma diversidade de gêneros poéticos e musicais que deixou a todos atônitos em alguns momentos. Ao lirismo de “Crepúsculo”, música composta sobre poema de Olavo Bilac seguiu-se “Desse Fruto”, música de Osnofa e Edvaldo Santana sobre poema de Akira Yamazaki  que narra as diferenças e as distâncias sociais que ainda persistem nas periferias de São Miguel e do mundo. Em seguida, fazendo um contraponto, Osnofa batuca em seu violão o samba Zé Neguinho trazendo ao conhecimento do publico os personagens e anti-heróis mais ilustres dos botecos e  das madrugadas de São Miguel.

Como se não bastasse, ele traz em sequência três canções de seu CD solo, “Pra Mim” (H-melanciou, Boleramba de Breque e Pré-doencia) que narram momentos de sua vida pessoal, rememorando os tempos em que trabalhava como técnico eletrônico e as consequências familiares quando decide tronar-se músico e se casar. Não me atentarei aqui em fazer uma análise mais profunda do ponto de vista formal e estético dessas composições mas acredito que voltarei a esse tema com mais subsídios em outro momento.

A arte de Zé Afonso Osnofa e o acontecimento, a verdade que ela nos trouxe nesta edição do sarau da casa amarela, aponta para um caminho, não trilhado pela grande indústria musical, mas que presumo ser vital que percorramos no contra fluxo das imposições culturais pasteurizadas a que somos submetidos diariamente. É chegada a hora de refletirmos um pouco mais sobre a arte e qual sua força diante deste mundo que nos é oferecido.

Zé Afonso Osnofa pode ser resumido nas palavras cortantes do poeta Carlos Moreira como:

o artista sem momento.
o artista sem patrão e sem limites.
o artista simplesmente
como o sujeito que entra de repente e ilumina a cena e revela a máquina
monstruosa triturando tudo.
porque sim. por que não?

_______________________________________________________________________________
  
Eder Lima: Músico (compositor, violonista e saxofonista) e Artista Plástico. Arte educador formado em Arte pela Unimesp e Pós-graduado em Estética e filosofia da Arte pela UNESP. Atualmente colabora com A Casa Amarela Espaço Cultural de São Miguel Paulista.

0 comentários:

Postar um comentário