Hans Christian Andersen |
Por Jeosafá
Nas distantes terras da Dinamarca, moravam um jovem
sapateiro e sua mulher, de muito mais idade, mas ainda jovem e trabalhadeira. Eles
eram muito pobres, tão pobres que, em meio aos ventos gelados do norte e à neve
frouxa do inverno, para suportar o frio e a fome, punham-se a assobiar malhando
solas de sapato e lavando montanhas de roupas dia após dia. O que ele ganhava
na sapataria e ela lavando roupas de manhã à noite era tão pouco que mal tinham
o suficiente para comer e vestir.
Então o jovem sapateiro teve uma ideia: “Vamos ter
um filho”. A esposa já vinha pensando nisso, mas, com tão pouco para dois, o
que comeriam e vestiriam três? Além disso, como se acomodariam todos em um
único quarto de dormir?
Porém, a verdade era que se todos pensassem assim,
a Dinamarca desapareceria do mapa, pois ninguém mais teria filhos, já que a
pobreza naquela época era mais abundante que os ventos cortantes e a neve
invernal.
O pobre sapateiro e a expedita lavadeira tiveram o
filho que desejaram, mas as roupas do menino, oh, que pobrezinhas, feitas e
remendadas pela própria mãe; e os brinquedos dele, então, oh, que toscos,
feitos à mão e pintados pelo próprio pai. O menino, a despeito disso, se sentia
um príncipe em suas vestes rotas e com seus brinquedos mal-ajambrados.
Na falta de veludo – dizia a mãe –, valha-nos a força de vontade. Por isso, os remendos bem
cozidos das calças e do menino davam a elas um alegre colorido.
Na falta de dinheiro – dizia o pai – valha-nos a
imaginação. Por isso, os carrinhos desengonçados do menino davam voltas
impossíveis e, mágicos, voavam pendurados no varal.
Sem um tostão para ir ao circo, o sapateiro
produziu marionetes e encenou episódios de teatro de bonecos, os mais
inacreditáveis já vistos, para o filho e a esposa, mas também para seus
vizinhos e respectivos filhos, que
também corriam pelas ruas enlameadas com suas roupas cheias de remendos e seus
brinquedos feitos de cabo de vassoura e lascas de pau.
Tão jovem morreu o sapateiro. Tão tristes ficaram
filho e mãe.
Porém, esta não deixou que os livros (de onde o pai
tirava os personagens para seu teatro de fantoches) e o amor pela imaginação (onde ele plantava
seus sonhos e colhia os sorrisos dos outros) se perdessem. Agora convertida
agora também em pai, no momento certo disse ao filho, quando os primeiros fios
de barba já despontavam na face branca: “Vá a Copenhague, e conquiste o mundo
com a imaginação que seu pai lhe deu e com a força de vontade que agora lhe ponho
em mãos, porque tostão, este não tivemos para legar”.
Com o beijo amoroso da mãe na face e a saudade do
pai no coração, Hans Christian Andersen partiu para conquistar Copenhague – e,
depois, do mundo. Não precisou de mais nada para produzir sua imensa fortuna e
legá-la aos que vieram depois, inclusive nós.
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