segunda-feira, 12 de maio de 2014

O PENSAMENTO VOA - Fora do comum

Às vezes, surge um rosto no metrô superlotado.

Por Rômulo Reis Cesco.

Ela me conhecia, mas não sabia quem eu era. Nos falávamos por entre as trivialidades de um dia-a-dia em que nos cruzávamos, trocando palavras ralas de profundidade. Um pouco malcriado, carrancudo em razão do sol que queimou meu rosto aquele dia - naquela manhã ao acordar, vi que tinha um pouco de serração acima do lago, logo achei que iria ser um dia nublado. Errado.

Foi de sol, tanto que a encontrei -  percebi que só a encontrava em dias em que saia o sol, coincidência, ou era o sol que saía quando ela resolvia sair de sua toca. Entretanto, essa cara de desgosto que eu vesti escondia a admiração pelo sorriso que ela sempre levava, sempre, sem exceção - e me chamava de amor, talvez por não saber meu nome. Sei lá se isso é importante, nunca me importei como me chamam, gosto que apreciem além dos rótulos, o nome acaba sendo só mais isso - tanto que hoje tem gente que até interpreta o indivíduo pelo nome que tem. Patético.

O vestido curto e a  maquiagem pesada dela não escondiam os hematomas, porém o sorriso estava ali, no seu posto fiel, tenho até compaixão por essa princesa que nunca teve lua de mel, nem castelo, nem seguidor fiel. Talvez tenha seguidor, não fiel, mas ocasional e altruísta, que admira e percebe o quão egoísta o mundo foi, e é com ela. Mas está ali, com o sorriso no metrô, mesmo depois de uma noite arregaçando a todo vapor.

Chegou na sua parada, ela desceu, não antes de dizer "Tchau amor" - Despi minha carranca e fiquei pensando: "Não me importo com o nome, antes um amor da desconhecida do que um ódio de um chegado do lado. "

Segui meu dia depois da conversa breve, desci, entrei no escritório, montei planilhas, usual; mas algo mudou, o sol tinha saído pra vê-la, talvez eu também saísse todo dia na esperança de trocar algumas palavras no metrô com aquela linda e sombria mulher, e entre as cinco estações que me fazia companhia, (antes de descer), era apenas pra iluminar meu dia, consciente disso ou não - não é paixão, é elemento novo no dia, que destoa da rotina da metrópole fria. E não é?!



Rômulo Reis Cesco é granduando de Direito pela Universidade São Judas Tadeu. Seus textos de natureza crítica assumem, porém, aspecto poético, e posicionam a condição da humanidade em geral e do jovem em particular sob a luz da reflexão filosófica. Seus textos são um convite ao compartilhamento e à solidariedade.



0 comentários:

Postar um comentário