Por Therezinha Hernandes.
Quantas vezes não ouvimos que
alguma coisa vai acabar em pizza? Com isso, quer-se dizer que algo não vai ter
solução, que tudo vai continuar como está.
Quando alguém deveria tomar uma
atitude, mas se omite, diz-se que essa pessoa está “dando uma de
joão-sem-braço”.
Você já se perguntou de onde vêm
essas expressões?
Hoje vamos desvendar algumas
delas.
Algumas resultam de
mal-entendidos. Sem compreender direito as palavras, as pessoas saíam repetindo
as frases de forma distorcida.
É esse o caso de “cuspido e
escarrado”, quando se quer dizer que uma pessoa é extremamente parecida com
outra. A frase original é “esculpido em carrara”, numa alusão à perfeição das
esculturas feitas num mármore de excepcional qualidade extraído na região da
comuna de Carrara, na Itália. Escarro é uma coisa muito nojenta. Uma bela peça
de mármore é muito mais plausível quando se trata de uma representação perfeita
de alguém.
“Batatinha, quando nasce,
esparrama pelo chão”. Esses versos populares revelam um equívoco: a batata é um
tubérculo; portanto, fica debaixo da terra. Como pode então se esparramar pelo
chão, se está debaixo dele? O que se vê acima do solo são as folhagens (ramas),
e assim a expressão correta é “batatinha, quando nasce, espalha a rama pelo
chão”.
“Cor de burro quando foge” sempre
parece indicar que o burro em fuga muda de cor, mas não é nada disso. A
tradição oral aos poucos foi modificando a frase, que inicialmente era “Corra
de burro quando ele foge”, pois esse animal é realmente perigoso se enraivecido,
e é obstinado quando persegue algo ou alguém.
Usa-se essa expressão como
referência a uma cor indefinida ou esmaecida, mas na origem era sinônimo de
prudência.
Ainda falando de expressões
inspiradas em animais, “quem não tem cão caça com gato”, denotando que, se um
problema não se resolve de uma determinada maneira, é necessário encontrar
outra solução. Na verdade, o cão é um animal de matilha; os cães selvagens
caçam em grupo. Já os felinos são animais solitários e independentes (sim, sim
– os leões não seguem essa regra) e por isso caçam sozinhos. O dito popular,
então, é “quem não tem cão caça COMO gato”, ou seja, sozinho.
“Cair no conto-do-vigário” até
hoje significa ser enganado por um estelionatário, ter prejuízo. Espertalhões não
faltam neste mundo. Essa expressão, porém, tem um fundo real, quando uma imagem
de Nossa Senhora dos Passos, presenteada pelos espanhóis à cidade mineira de
Ouro Preto, foi disputada pelos vigários de duas igrejas (Nossa Senhora do
Pilar e Nossa Senhora da Conceição). A fim de resolver o impasse, o vigário do
Pilar propôs amarrar a imagem no lombo de um burro, que seria colocado no meio
do caminho entre as duas igrejas. O rumo que o burro tomasse indicaria a igreja
vencedora. Quando solto, o animal imediatamente seguiu para a Igreja do Pilar.
Mais tarde, descobriu-se que o burro pertencia ao vigário daquela paróquia,
cuja esperteza rendeu a expressão usada até hoje.
Deixar alguma coisa ao “Deus-dará”
significa não tomar nenhuma decisão, abandonar alguma coisa ou alguém à própria
sorte. Essa expressão é usada desde tempos muito antigos, quando os
transeuntes, tentando se esquivar das mãos estendidas dos pedintes, diziam
“Deus dará” (eu não lhe dou esmola, mas Deus dará). E lá ficava o mendigo,
seguindo a vida aos trancos e barrancos.
Aliás, “aos trancos e barrancos”
é outra expressão usada até hoje para indicar uma situação penosa, algo que
segue adiante ainda que enfrentando dificuldades. A palavra tranco, além de
significar um golpe brusco (golpe físico ou do destino), também é o nome que se
dá ao salto do cavalo. Em Portugal, de onde se originou a frase, barranco é uma
vala aberta no chão por mãos humanas ou por ações da natureza. No Brasil,
barranco é a ribanceira de um rio de margem íngreme. De qualquer maneira, andar
por um terreno acidentado no lombo de um cavalo que dá trancos é uma imagem
muito bem associada às vicissitudes.
Depois de contos-do-vigário, de
trancos e barrancos, e também de correr de burro quando foge, melhor acabar
tudo em pizza. De onde vem essa expressão? Do futebol!
Hoje em dia, “acabar em pizza” é
uma frase muito empregada quando se fala de política, ou de julgamentos que não
resultam na devida punição. No entanto, sua origem está na década de 1960,
quando alguns dirigentes do Palmeiras (Sociedade Esportiva Palmeiras, antigo
Palestra Itália) se reuniram para tratar de problemas do clube, resultando em muitas
brigas, sem que se chegasse a nenhuma solução. Após catorze horas de discussão,
todos estavam com muita fome e resolveram ir para uma pizzaria. Lá, depois de
muitos canecos de chope e dezoito pizzas, desistiram do debate e tudo ficou por
isso mesmo.
Se as decisões forem adiadas,
acabando sempre em pizza, a vida pode se tornar uma casa-da-mãe-joana – mas
isso já fica para a próxima conversa, que já fica prometida, pois não sou
nenhum joão-sem-braço.
Beleza, dona Thereza. Depois vou reunir uns ditados pra te andar. Beijos.
ResponderExcluirTexto cativante e elucidativo Therezinha Hernandez.
ResponderExcluirBjo !