quinta-feira, 3 de julho de 2014

SALA DE LEITURA - Carolina Maria de Jesus

Prof. Sirlene. Ao fundo, Carolina: grande mulher, grande escritora do Brasil.
Por Sirlene Barbosa.

Quando a apresentei, ouvi risos, zombarias, comparações tipo: – olhe a sua mãe!!! (risos... muitos risos...). 

Sim, uma preta, numa favela diferente da que eles moram (bem pior, até porque eram os anos 1950... em 2013, as coisas mudaram).

Ela não tinha a mesma “classe” que o tal Machado nem o Aluísio, muito, mas muito menos que a tal Clarice que a tal professora da sala de leitura os apresentou... O Mário do Macunaíma e o Machado da Capitu são “brancos”, assim como a Cecilia e o Manuel... Difícil, eu sei. Minha atitude? Desconforto total, mas misturado com muita indignação.

Questionei-os: – Por que estão rindo? – Por qual motivo? – O que está acontecendo? Os estudantes passaram, então, a me ouvir. Devem ter se lembrado de que para falar de Carolina, mostrei a mesma paixão que tive para apresentar Poe, Cammus, Lima e Clarice... Será? Eu não sei bem. Constatei, no entanto, o desprezo que a ex-catadadora de material reciclado sentiu na pele, morando na Favela do Canindé nos anos 1950, com três filhos para criar e só neste mundo doído e desigual.

Entendi que os que riram não queriam se identificar com ela ou com o mesmo universo dela – escarneço para me sobrepor ao meu igual, pois oprimindo eu me sobreponho; sou, portanto superior.
Consegui, no entanto, ler Quarto de despejo, discuti e promovi leitura entre a turma. Foi interessante e alguns deles se emocionaram (sim, repito: alguns se emocionaram).

Bem, comprovo, por meio deste texto curto, que Carolina Maria de Jesus ainda sofre o preconceito que sofreu no bairro paulistano de Santana, em sua Casa de alvenaria.

E o que ela mostrou em Diário de Bitita se comprova: o descendente “claro de negro”, nossos famosos marrons, mas de cabelo liso, com traços “de branco” e, muita das vezes, branco, não se identifica como negro e quer distância dessa descendência.

Triste... mas a arte pode curar isso.

Difícil, devagar... mas eu não deixo de acreditar num mundo onde as pessoas consigam ler mais e melhor uns aos outros.

E como sempre: viva a boa literatura!


VAI BRASIL!

Sirlene Barbosa é Mestra em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem – PUC-SP, professora de língua portuguesa de colégio particular e da Sala de Leitura da PMSP. Escreve todas as sextas-feiras a coluna Sala de leitura para o blog da editora Nova Alexandria.



DICA DE LEITURA:



0 comentários:

Postar um comentário