quarta-feira, 30 de abril de 2014

BRASIS, PORTUGAIS E ÁFRICAS - Antes de fuxicar o baú dos contos populares...

Câmara Cascudo: trabalho incansável pela cultura  popular.

Por Susana Ventura.

No momento em que parte do público brasileiro tem em casa DVDs de Walt Disney com animações realizadas a partir de contos de fadas,  acompanha pela TV aberta  ou em TV a cabo à série norte-americana ‘Era uma vez’ e que, em anos recentes, viu em suportes diversos filmes como ‘Branca de Neve e o Caçador’, ‘Malévola’ e ‘Para sempre Cinderela’, parece-me bom darmos um passeio. Vamos?

Ok, primeiro uma voltinha básica pelas principais livrarias das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre em busca de livros ‘com’ contos de fadas. Ah, estão cansados? Tudo bem, compreendo, é quinta-feira. Deixem comigo, lá vou eu e conto a vocês o que acontece.

Na livraria escolhida, ao pedir ajuda a um vendedor ou vendedora, você será direcionado à seção infantil da livraria e ali encontrará MUITOS livros com capas chamativas, a maior parte em tons de rosa. Após sobreviver  à nuvem rosa (juro solenemente que, numa livraria de São Paulo, fiquei enjoada de capas ‘rosa choque’ – devo voltar ao normal em cerca de um ano, caso não seja novamente submetida àquilo), foi possível chegar a algumas outras propostas, dispersas pelas estantes: boas traduções, recontos bem realizados, projetos gráficos interessantes, ilustrações bonitas. No processo de busca, foram encontrados também alguns livros de Hans Christian Andersen, de exemplares do conto ‘O patinho feio’ ou ‘A pequena sereia’ em edições ilustradas e voltadas para os pequenos leitores a edições mais sofisticadas, com um bom número de contos traduzidos diretamente do dinamarquês.

Mas vou andar um pouco mais, já estou no caminho mesmo, não custa. Voltinha estendida, passo por livrarias em Buenos Aires, Montevidéu, Lisboa e Madri. O quadro  será bastante similar. Fiquemos, no entanto, aqui pela América do Sul: o frequentador de livrarias no Brasil terá certa dificuldade para encontrar, de imediato, obras de Sílvio Romero, Câmara Cascudo e Marco Haurélio. Mas na Argentina não será diferente: Susana Chertudi e Berta Elena Vidal de Battini, só depois de boa procura. No Chile, encontrar de imediato obras de Yolando Pino Saavedra? Difícil também.

Matutemos juntos... e aproveito para responder a perguntas frequentes (sim, eu já tenho uma lista de perguntas frequentes sobre o assunto...)

     – Charles Perrault e Jacob e Wilhelm Grimm ‘inventaram’ os contos de fadas? Não.

     – Os contos que eles coletaram, ouviram, adaptaram são mais importantes que os outros que foram publicados por Pitré na Itália, Consiglieri Pedroso em Portugal ou Chertudi na Argentina? Não.

Ué, então por que só lemos – quando lemos – os contos de Perrault e Grimm e a maior parte do cinema de animação se baseia somente nos contos deles, com uma ou outra incursão na obra de Andersen?

Hummm, será que o motivo é que ainda nos pensarmos de maneira eurocêntrica? E que, dentro da Europa, continuamos estamos de olho no que dizem os centros de poder simbólico dos séculos XVIII e XIX?

Ai! Será? O que me dizem vocês? Para que lado continuamos esta conversa: aprofundamos no Perrault e no Grimm (é uma boa) ou partimos para falar em como nós (não)  costumamos pensar na literatura para crianças? Decidimos no par ou ímpar ou votamos e ganha a maioria? 

5 comentários:

  1. Oi, Susana!!
    Às vezes acho que fui criada por ETs, pois meus pais compravam para nós, meus irmãos e eu, livros de lendas brasileiras, coleções de contos de vários países, discos da Inezita Barroso e Ely Camargo,e por isso desde criança tive contato com Câmara Cascudo, Sílvio Romero, Assis Chateaubriand (e outros folcloristas). Depois, na adolescência, travei contato com a música de Marlui Miranda. Em boa hora vem o trabalho de resgate de nossas raízes culturais, e certamente será saudável para o nosso público jovem conhecer tradições de outros países. Perrault, os Grimm e Andersen povoam meritoriamente nosso imaginário, mas uma viagem por outras culturas é sempre muito enriquecedor - e nada melhor do que começar pela nossa. Fale mais sobre os nossos folcloristas! Sei que você tem muito a dizer sobre eles...
    Um grande beijo e obrigada por partilhar conosco a riqueza da cultura popular.

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    1. TT, seus pais eram maravilhosos ETs!!! E a falta que essas referências fazem você nem pode imaginar. Uma vida simbólica vazia faz o percurso humano ser radicalmente mais difícil. Um grande abraço de 1o. de maior e obrigada por acompanhar a coluna.
      Susana

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    2. Susana, sou eu quem agradece a existência da coluna - é um prazer enorme acompanhá-la.
      Agradeço aos céus também pela minha "abdução" (rsrs), e procuro repetir a dose com meus filhos.
      Uma infância sem contos (orais e escritos) não tem alimento para a imaginação. É como ter um brinquedo movido a bateria, que faz um milhão de coisas: ele brinca sozinho, deixando a criança de fora, só observando.
      Outro abraço de 1.º de maio pra você!!
      TT

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  2. Voto pela segunda opção. Nas duas perguntas finais.
    bjs. Tom

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  3. Oba, Tom! Obrigada pelo voto. E vamos em frente! Beijos, Susana

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