
A Copa acabou e, por enquanto, me recuso a ‘dar balanço’. É cedo para mim, preciso respirar e aquietar as emoções que ainda estão muito pulsantes. Hoje cedo eu ainda pensava no recente endeusamento alemão ao espiar a TV que estava ligada num dos cômodos da minha casa.
Ter herois, precisar de herois,
tudo bem, o problema parece-me a velocidade com que as pessoas têm corrido de
um lado para o outro, tentando sempre embarcar na canoa do vencedor.
Com a mesma pressa, vejo a terrível
negação da dor: é só jogo, não interessa. Interessa mesmo é ter prêmio Nobel e
isso não temos. Oi? Quer dizer, para me consolar eu aproveito para lembrar o
que o Brasil não tem: Prêmio Nobel? Mais uma vez a busca da chancela exterior,
da aprovação eurocentrada de que o Brasil tem excelência...
Aproveito também para invalidar a emoção e a campanha: é só um
jogo.
Ah, então ‘tá’. Vou entrar nessa
também: o amor não deu certo, mas bem,
era só amor, né? O trabalho também deu
errado, mas bem, o que é trabalho, né?
A viagem para a praia foi um
horror, mas bem, eram só férias, né?
Cansaço... e, poucos minutos antes
do jogo da final começar - sim, assisti
e sofri pelo Brasil no sábado e viajei para estar com minha família para a
final, estourei pipocas e torci!!! – minha mãe nos lembrou de uma história de
família das mais deliciosas.
Para dizer tudo em poucas linhas,
basta contar que meu avô um dia chegou para ‘noivar’ e, ao entrar na sala,
visualizou a futura sogra correndo com uma tesoura aberta atrás do futuro
sogro, furiosa e falando uma língua arrevesada.
Pois bem, o meu bisavô, o que
escapava da tesoura com elegância e galhardia, tinha três irmãs: Aurora, Lídia
e Clara.
Num belo dia, pela mesma época do
caso da tesoura, veio a tia Aurora visitar a família. Sentada na cozinha ela
viu as meninas da casa entrarem, cada uma com seu feixe de lenha na cabeça.
- Ai, que lenha tão bonita. Bonita mesmo essa lenha... me deu até vontade
de ir
lenhá.
Minha avó logo se adiantou:
- Mas vamos, tia Aurora!
A senhora mexeu-se na cadeira e
resolveu se informar melhor:
- E onde apanharam essa lenha. Ai, que bonita que está...
Explicação da sobrinha:
- Do outro lado da ponte, tia. A
gente anda, cruza o pontilhão, cata a lenha, faz o feixe, põe aqui essa rodilha
na cabeça, equilibra o feixe em cima e volta.
A tia pensou, pensou e deu o
veredicto:
-
Que vontade de lenhá c’ocêis! Não fosse carregá o feixe de lenha na cabeça e atravessá o pontião, bem que eu ia...
Desde então o ‘causo’ deu origem ao
bordão doméstico para os que recusam qualquer esforço ‘não
fosse carregá o feixe de lenha na cabeça e atravessá o pontião, bem que eu ia!’
A Copa acabou, a campanha não deu
certo. Os protagonistas da minha historieta estão há muito desaparecidos (tia
Aurora viveu 100 anos, aliás). Mas as emoções verdadeiras, estas nos
acompanham. Não se recusar à vida tem suas vantagens. Não parece, mas tem...
Acho que a sua tia Aurora era minha conterrânea.
ResponderExcluirTom Torres,
ResponderExcluirMas menino, eu não tinha pensado nessa possibilidade!
Um abraço, amigo e obrigada por acompanhar a coluna.